XXXVI
—
Eu nem
sei se isso vai mesmo funcionar… – Lyra sacudiu o orbe contra a luz do sol.
Havia
algumas nuvens lá longe, e o cheiro de chuva aumentava. Ela não queria que
chovesse. Theo não gostava de chuva.
— Nós
estávamos brigando, certo? Quando o ativamos? – Pyro a olhou.
— Aham, e
eu queria te matar.
— Talvez
se juntássemos nossas energias de novo… – Pyro concluiu.
— O
problema é: e se nós nos perdermos de novo? – Lílian levantou a questão. Se
perdermos o orbe de novo? Porque… eu acho que essa coisa tem vontade própria. –
apontou a esfera.
— Hey,
coisinha. – Lyra o cutucou. – precisamos ir pra Raython, entendeu? Raaaaython.
O passeio acabou. Sei que você não deve gostar do velho Phyreon, mas precisa
voltar pro mofo da sala dele.
— Me vê
isso aí, Ly.
Lyra
entregou o objeto para a prima, que o olhou por muito tempo.
—
Impregnei com energia minha, e agora já decorei a presença dele. Será fácil
achar. Cada um de nós temos aura, podemos nos encontrar. Você também, Varsak. –
ela olhou pra trás.
Estavam
todos ali, onde Varsak se escondia. Theo e a irmã, e Archie e sua irmã também. Nenhum
adulto. Amy não soltava a mão de Pyro.
— E se não
der certo? – Archie perguntou.
— Estamos
perdidos. – Lyra disse num suspiro.
— Vou dar
– Lílian ergueu um dedo. – dez minutos para vocês chora- se despedirem.
Lavender
correu para abraçar Lílian, surpreendendo-a.
— Vou
sentir sua falta – ela lhe disse no ouvido – e de fazer vestidos pra você, e de
fazer penteados no seu cabelo.
— Eu
também, Liv.
— Você
também, Lyra. – Liv a abraçou antes que ela e o irmão grudassem. – Vocês foram
as melhores amigas que tive, sabe?
— Amy vai
ficar com ciúmes. – Lyra riu.
— Amy não
está nesse mundo mais – Liv a olhou de esgrelha, o rosto enterrado no peito de
Pyro.
Archie se
aproximou.
— Eh… eh.
As meninas
riram.
— Eu tenho
que agradecer por tudo sabe. – ele coçou a cabeça, tímido.
— Nah. Nós
nem ajudamos você a pegar a Liv.
— Ajudaram
sim, se não fosse a confusão toda ainda estava na mesma. – ele pôs as mãos nos
bolsos.
Eles voltaram
a rir.
Pyro não
queria soltar Amy. Não queria se livrar do cheiro bom dos cabelos finos dela.
Não queria esquecer…
Mas poucas
vezes na vida fez o que queria.
— Amy. Não
fique assim, eu vou me sentir mal.
— Não
estou chorando, se quer saber. – ela ergueu aos olhos. Não chorava, mas estava
quase.
— Sério,
Amy. Não fique assim. Talvez uma semana ou duas, mas… você precisa esquecer.
Ela
balançou a cabeça.
— Garotas
não esquecem o primeiro namorado, Pyro.
— Supere
então.
— Não sei.
– ela sussurrou.
— Sim,
você vai. Eu juro, Amy. Juro que queria você comigo, mas… eu não posso. Você
não pode. Eu- – ele hesitou.
— Eu sei.
Lyra falou que nem seus irmãos pequenos moram com sua mãe por causa do ar. Eu
entendi.
— Eu nunca
vou me esquecer de você, ouviu? – ele ergueu o rosto dela pelo queixo. – Me
perdoe. Por te fazer sofrer.
— Se for
assim, eu devo pedir perdão também, Pyro. E você também precisa me superar.
Entendeu?
— Não… –
ele engoliu a vontade de chorar, e a beijou. – sabia que… você é a primeira
pessoa que eu me apaixonei?
— Não. –
ela corou.
— Sim, é.
Eu te amo, Amaranthe Leadengear. Minha aviadora.
— Eu
também te amo, Pyro Watari. Meu príncipe. – ela ainda conseguia segurar as
lágrimas. Mas não por muito tempo.
Pyro a
beijou novamente.
— Eu vou
plantar um jardim de amarantos em Magma. Não sei como, mas vou. – beijou-lhe a
fronte – pra nunca te esquecer. Nunca.
Lílian
passou a falar qualquer coisa com Archie, e Lyra se aproximou de Theo.
— Pois é.
Eu disse pra Liv que se ela te visse com qualquer sintoma de depressão, deveria
dar um chute no seu nariz. – ela arrumou o colarinho da camisa dele, sorrindo.
— Liv não
tem sua força.
— Aí eu
disse que se não quebrasse nem nada, era para pegar uma panela ou um toco de
madeira ou qualquer coisa pesada.
Theo riu.
— Vou
falar algo assim com Lílian então.
— Nem vem,
Lílian me massacra. – ela o olhou. – você vai ficar bem.
— Não
tenho tanta certeza. – ele suspirou.
— Vai sim.
— E você,
vai ficar bem?
— Não. Eu
roubei a coisa de Phyreon, lembra? Há um sermão e um castigo tenebroso me
esperando.
— Não
distorça o que eu disse. – Theo ficou sério.
— Certo.
Não, eu não vou ficar bem. – ela disse com seriedade. – Não pelos próximos…
meses.
Ela sentiu
aquele bolo inconformado na garganta. Tinha mesmo que ir? Não podia largar tudo
e ficar ali?
Raython
podia ser governada por Phyreon, o maldito é imortal, não? Ele não precisava
voltar. Não queria voltar.
Não queria
se separar dele.
— Não me
olhe assim, Theo. – ela virou para a esquerda.
— Eu ainda
queria ir com você. Eu ainda deixaria tudo isso aqui por você, Lyra. Sabe
disso.
— Não,
você não pode. Não ainda… – ela o olhou, forçou-o a encará-la. – Você não está
pronto pra largar tudo assim.
— Mas eu…
não quero te perder, pelos infernos- – ele a abraçou. – eu faria qualquer coisa
pra fazer você ficar, ou pra ir com você. Qualquer
coisa, Lyra.
Ela o
empurrou.
— Eu
também, Theo. E eu vou. Eu juro que vou voltar aqui. – ela tirou um dos
brincos, e depois o outro. Pegou a mão dele e os colocou na palma. – E pro caso
de você os jogar no Ruby – Lyra apertou dois dos dedos no pulso dele, e Theo
travou os dentes para não gritar.
Ela o
queimou com eletricidade.
— Não…
obrigado. Mas eu não vou jogá-los no Ruby. E sabe, eu… – Theo colocou a outra
mão no bolso e tirou o relógio de bolso.
Ele
revirou a casa de Archie inteira até encontrá-lo, já que o exército o tomou
quando o prenderam. Pensou que nunca acharia, mas foi precisamente persistente.
— Desde
aquele dia eu quis te dar ele. Aquele dia na sala, lembra?
Lyra
assentiu.
— Eu
queria te beijar ali. Mas pensei que… você não merecia. Não merecia ser mais um
garoto que eu ia iludir. E olha só onde estamos.
— Você não
tem culpa – ele guardou os brincos dela e lhe entregou o relógio. – guarde bem.
– beijou-lhe a fronte, devagar.
— Eu vou
te devolver, Theo. Eu vou. É uma promessa.
— Throwers
não quebram promessas.
—
Lembre-se disso. – ela o abraçou. – Você vai me esperar?
— Vou,
Lyra. Claro que vou. Porque eu te amo. – ele ergueu o rosto dela. – eu te amo.
— Eu
também te amo, Theo. E… e é. É isso. Amo você. Quantas vezes eu quis dizer
isso, e não conseguia? Eu não queria acreditar.
Mas é verdade. Meu castigo.
— E meu
também. – ele encostou os lábios nos dela delicadamente. – Você tem que ir.
— Mas eu
não quero.
— Mas você
vai. Porque você precisa. Assim como eu preciso ficar, você precisa ir. Mas eu…
vou te esperar.
Lyra o
beijou. Por um momento que pareceu ser uma eternidade. Um momento que ela
queria que fosse uma eternidade.
Partiu o
beijo, e disse ao seu ouvido:
— Vai
chover.
E o
empurrou novamente, virando de costas.
— Vamos. –
disse, seca.
—
Afastem-se. – Lílian disse. – muito mesmo.
Os garotos
obedeceram, e andaram indefinidamente.
Lá longe,
Theo avistou o dragão negro. Talvez a coisa mais linda que já viu. Ele bateu as
asas e rugiu alto, despedindo-se.
E depois,
uma luz branca o cegou.
E eles
desapareceram.
Um trovão
soou lá longe.
Vai chover.
●
Lyra
inspirou.
Cheiro de
mato, de lama, de limo e musgo.
Chuva
molhando o rosto.
Não,
aquilo eram lágrimas.
Frio, umidade,
e um trovão.
Abriu os
olhos, e a primeira coisa que viu foi na verdade uma garota. Uma garotinha que
mal alcançava a sua cintura, de cabelo branco e olhos azuis escuros. Estava de
boca aberta, assustada.
Os lábios
de Lyra tremeram, e ela correu, caindo de joelhos em frente e à garotinha.
— Anne. Anne. – abraçou a irmã como nunca
abraçara antes.
E chorou.
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